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Atenção com os "Simoníacos" modernos das Redes Sociais

Usam o bom nome da ciência para fazer promessas falsas de saúde.
29, Dezembro 2024

A simonia é coisa antiga. Na Idade Média ela era uma prática comum entre aqueles membros do clero mais apegados a bens materiais que faziam de tudo para juntar alguns trocados – às vezes verdadeiras fortunas – para os cofres da Igreja. O funesto hábito se refere à venda ilícita de favores espirituais, como no caso de religiosos que trocavam uma suposta vida eterna após a morte por dinheiro bem vivo. A prática de vender promessas espirituais era oficialmente proibida pela Igreja. Porém, à certa altura, ela se tornou tão comum que foi uma das principais motivações para a cisão vista no cristianismo do século XVI.

Os simoníacos modernos são um pouco diferentes, pois usam o bom nome da ciência – para muitos, uma nova religião – e suas prerrogativas profissionais para vender a preço de ouro promessas de saúde que não têm como cumprir por estarem muito além de seus supostos poderes terapêuticos. Apesar de fazerem parte do “clero da saúde”, eles desrespeitam seus respectivos códigos de ética ao mercantilizarem de maneira abjeta os cuidados de saúde. Em vez da vida eterna, os simoníacos das redes sociais comercializam o ideal de uma longevidade bela e saudável, o que para muitos teria um valor ainda maior do que a vida eterna de outrora. É por isso que suas vítimas – jovens, ricas e saudáveis – gastam fortunas em poções mirabolantes que lhes garantiria uma vida longa e saudável.

Assim como as vítimas dos simoníacos antigos não estariam vivas para reclamar seus direitos no caso de não obterem a vida eterna após a morte terrena, os incautos que hoje enriquecem os simoníacos de jaleco branco também não se lembrarão dessas promessas daqui a vários anos. Pior que isso: eles farão questão de esquecer que caíram em um golpe que é, ao mesmo tempo, tão antigo e tão banal, embora siga fazendo vítimas de forma constrangedora.

Em seu famoso inferno, Dante reservou um castigo à altura dos crimes cometidos pelos simoníacos: eles ficavam por toda a eternidade pendurados de cabeça para baixo em buracos estreitos, apenas com as pernas para fora e com fogo ardendo sobre as plantas dos pés, os quais eram constantemente sacudidos para evitar a terrível dor das queimaduras. É claro que os simoníacos modernos não recebem nenhuma punição parecida. Pelo contrário, a inversão de valores que caracteriza a sociedade atual parece recompensar o comportamento dos simoníacos, preferindo punir os pobres mortais que acreditam em suas declarações pseudocientíficas fantasiosas.

São simoníacos modernos aqueles que prescrevem os famigerados e coloridos “soros da longevidade”; aqueles que entopem seus pacientes de hormônios desnecessários e perigosos; aqueles que fazem prescrições quilométricas contendo todos os micronutrientes existentes e absolutamente inúteis; aqueles que solicitam todas as dosagens laboratoriais possíveis de serem feitas; aqueles que promovem substâncias bizarras como fontes de longevidade e da eterna juventude; aqueles que assustam pessoas saudáveis com a ameaça de doença e morte; enfim, todos aqueles que, em troca de ganhos materiais, distorcem a ciência e envergonham a boa medicina.

A porta do inferno de Dante trazia uma curiosa inscrição que anunciava a desgraça enfrentada por todos aqueles que a atravessavam. Talvez a mesma inscrição devesse ser mostrada também na página inicial do famoso aplicativo a todos aqueles que ousam penetrar no inferno abjeto do Instagram médico: “Deixai fora toda esperança, ó vós que entrais!”

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